"Há pessoas que partem. Apenas partem. Há pessoas que partem e se vão. Mas há pessoas que se vão e não partem".
Inajá Martins de Almeida
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Já com idade avançada, nos seus noventa e quatro anos, vejo meu pai. Quieto, absorto nas leituras, sempre concentrado em seus pensamentos.
Ora lê. Ora escreve. Pouco fala. A audição e os passos lentos, lhe dão sinais da longevidade, mas a mente, mostra lucidez aguçada, que o tempo não corrompe.
Leitor perspicaz, a memória não o condena. O passado, no presente, está sempre a colocar na pauta do dia. Nem ao menos uma vista além de um ponto lhe passa despercebida.
Os livros - paixão sempre presente. Interessado pela leitura e pelo transmitir o gosto e o saber de sua importância, tem no interesse da nova geração o galardão maior. Ademais
São poucos os que se sentam para ouvir histórias.
São poucos os que se dedicam a contar histórias.
Por serem poucos, são raros e necessários.
Historiador. Narrador incansável dos fatos históricos, muitos dos quais vividos e vivenciados.
A história em sua mente sempre pronta a ser resgatada. Novelos de linhas intermináveis alinhavam e tecem os mais belos álbuns dos municípios - Araras, Rio Claro, Araraquara, Leme...
Suas figuras ilustres ocupam lugar destacado em seu fazer História - Dr. Armando de Oliveira Salles, Maestro Francisco Paulo Russo, Ignacio Zurita Junior, Martinho da Silva Prado, Amadeu Salviato, Carlos Viganó. Tantos outros. Tantos.
E é na abertura de uma de suas maiores obras - Álbum de Araras, 1948 - que vê a compensação do árduo trabalho coroado de êxito pela iniciativa.
Surpreende os que a aguardavam "pela justeza e pelo cunho de honestidade que imprimimos a ela".
E continua:
"Com esta obra, que requereu de nós sete longos meses de trabalhos exaustivos cremos ter cumprido fielmente a nossa missão, dotando Araras de seu mais rico documentário histórico-ilustrado que, enfrentará a posteridade, glorificando-se na imortalidade destinadas às obras de tal envergadura".
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A longevidade, entretanto, o priva da esposa, ararense, Dalila Salviatto de Almeida e do filho Itabajara, os quais há muito partiram. Entretanto, agracia-o com a nora sempre presente Ivani, os netos Alexandre, Juliana e David e cinco bisnetos - João Victor, Ana Clara, Ana Júlia, Rafaela e Sofia.
À filha Inajá, lega-lhe o prazer pelas linhas. O gosto pelos livros. O recolher dos retalhos. O amealhar lembranças. O registrar memórias. O contar histórias. Vasto material inédito. Herança incalculável.
Meu pai. Nelson Martins de Almeida, forjou minha vida entre livros, quando então passo a declinar que entre livros nasci. Entre livros me criei. Entre livros me formei. Entre livros me tornei. Enquanto lia o livro, lia-me a mim o livro. Hoje não há como separar: o livro sou eu - bibliotecária por opção, paixão e convicção.
Mais ainda, amante das letras e das linhas, das pesquisas e da narração. Herança maior que desde tenra idade me fora incutida pela mãe fantástica e sempre presente, pelo irmão dedicado e bondoso e pelo pai, observador, pesquisador inquieto e realizador de obras magnas que a história pode registrar.
E é na tarde ensolarada e fria de outono, na cidade de São Carlos, que a história se faz testemunha a registrar um fato.
Momento em que o "Historiador de Araras", impoluto, a contemplar seu silêncio interior, cônscio do seu legado inestimável, numa elegância e postura peculiar "monta num querubim e voa levado pelas asas do vento!" (Sl 18:50)
Nelson Martins de Almeida nasce em Araras, aos 19 de março de 1918 e falece em São Carlos aos 08 de maio de 2012, aonde residia com sua filha.
Inajá Martins de Almeida